segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Felicidade: a vida como criação

Semana passada assisti a um vídeo com o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, organizado pela CPFL Cultura. Particularmente, eu o admiro muito e vejo coerência em duas ideias. Os trinta minutos de diálogo são bons, sem exceção alguma. No entanto, um dos momentos que mais me chamou a atenção está no final. As pessoas estão acostumadas a pensar na famosa "receita da felicidade", como se ela realmente existisse. Dessa vez, pouparei meus comentários, pois qualquer tentativa de equivalência à fala do Bauman será pura pretensão.

"Há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis para uma vida satisfatória, recompensadora e relativamente feliz: segurança e liberdade. Você não consegue ser feliz, não consegue ter uma vida digna na ausência de um deles. Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos, incapacidade de fazer nada, planejar nada, nem mesmo sonhar com isso. Então você precisa dos dois. Entretanto, o problema é que ninguém ainda, na história do planeta, encontrou a fórmula de ouro, a mistura perfeita de segurança e liberdade. Cada vez que você tem mais segurança, você entrega um pouco da sua liberdade. Não há outra maneira. Cada vez que você tem mais liberdade, você entrega parte da sua segurança. Então, você ganha algo e perde algo.
[...] Então, minhas conclusões são duas. Em primeiro lugar, você nunca encontrará uma solução perfeita do dilema entre segurança e liberdade. Sempre haverá muito de uma e muito pouco de outra. E a segunda é que você nunca irá parar de procurar essa mina de ouro.
Eu não acredito que haja apenas uma forma de ser feliz. Há muitas formas de ser feliz. [...] Há dois fatores relativamente independentes que dão forma à vida humana. Um deles é o destino. O destino é o apelido para todas as coisas sobre as quais não temos nenhuma influência; é o que acontece conosco, mas não foi causado por nós. Isso é destino. E o outro é o caráter. O caráter é algo muito individual, você pode trabalhar em cima do seu caráter. Se quiser, você pode mudá-lo, melhorá-lo; boa parte dele está sob o seu controle. A divisão de trabalho entre o destino e o caráter é tal que o destino estabelece a gama de opções que são realistas para você. Sobre isso, você não tem nenhuma influência. [...] Porém, as escolhas entre essas opções são feitas pelo caráter. E como os tipo de carátr são muitos e bem diferentes, não é possível dar uma receita para a felicidade. Eu sei que hoje existem consultores ganhando muito dinheiro fingindo que possuem receitas para a felicidade. Não acreditem neles; eles estariam enganando você. Eu jamais ousaria dar este tipo de conselho.
Não estou me comparando a Sócrates, mas muitos filósofos contemporâneos consideram a vida de Sócrates, sua personalidade, que ele construiu, como a relativamente mais perfeita possível que se pode imaginar. Mas o que isso significa? Significa que o tipo de vida escolhido por Sócrates era considerado a solução perfeita para Sócrates? Significa que todos nós devemos imitar Sócrates e tentar ser iguais a ele? Não. Pelo contrário, porque Sócrates precisamente considerava que o segredo de sua felicidade estava no fato de ele prórpio, por sua própria vontade, ter criado a forma de vida que ele viveu.
As pessoas que imitam a forma de vida de outra pessoa, o modelo de felicidade de outra pessoa, não são como Sócrates. Pelo contrário, elas traem a receita dele. Elas tarem sua receita, precisamente porque sua receita... Bem, você pode traduzir isso em termos simples, dizendo que para cada ser humano há um mundo perfeito, feito especialmente para ele ou ela".

Esta reflexão sobre a felicidade pode ser encontrada no livro do Bauman que se chama A Arte da Vida. Para os que insistem em acreditar na receita da felicidade, só resta afirmar que a essência está justamente na (auto)criação; é o ato de criar que nos proporciona uma vida única e peculiar. A todo o momento nos vemos em situações em que são ditados valores, normas, formas de se agir, de se comportar. Tudo isso para vivermos dentro daquilo que chamamos de padrão, e justamente este é o caminho a que estamos sendo conduzidos em relação ao modo de viver quando nos deparamos com livros e gente oferecendo receitas para a felicidade. A padronização de um estilo de vida é o limite daquilo que há de mais vulgar.

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