Lendo o blog do historiador Rodrigo Lacerda (Clique aqui) sobre a classe média brasileira, não podia deixar de fazer algumas observações. Apesar de simples, elas são o centro da minha idéia sobre esta chamada classe média. E minha falta de tempo não permite que eu discurse por muito tempo sobre.
- As pessoas com quem tenho a oportunidade de conversar sobre assuntos sociais e políticos sabem que sou da seguinte opinião: não existe classe média. No fundo, Marx tinha razão. Só há duas classes: burgueses e proletários. Adequando essas terminologias para nossa sociedade (muito mais complexa que a do velho barbudo), recorro a Ricardo Antunes que diz: só há duas classes: uma que vive do capital e outra que vive do trabalho.
- No entanto, não posso negar que no Brasil é evidente (e as pesquisas mostram e comprovam) que existe um grupo (hoje soma 52% da população brasileira) "intermediário", conhecido como classe média. Mas quem são essas pessoas? Trata-se, a meu ver, de um grupo sem identidade, de uma classe, como disse Lacerda, politicamente orfã.
Como justificativa, atenho-me aos seguintes argumentos:
Primeiro: É uma classe que está consumindo demasiadamente. É o grupo que está sustentando a classe que está acima, mas este grupo não pode se atraver a tomar o poder desta classe de cima: "Enquanto você melhorar a economia do país, tudo bem. Ótimo para mim, ótimo para você. Mas coloque-se no seu lugar, que não é no topo da pirâmide". É mais ou menos assim.
Segundo: Já que o assunto é melhoria, é fato e os números indicam que a economia do país está melhor. Claro, quanto mais se consome, mais o país produz, mais "ele vai pra frente". Mas essa mudança nos números não indicam uma mudança qualitativa. Este grupo está gastando mais, mas e a educação? E a saúde? Sabemos que essa melhoria fundamenta-se em dados estatísticos, descartando a qualidade do desenvolvimento.
Terceiro: Justamente por isso, vejo um retrocesso do ponto de vista intelectual deste grupo chamado "classe média". Preferem comprar o sapato da estação do que um livro. Preferem passear em shoppings do que em museus.
- A ilusão da ascenção deste grupo é tão medíocre que ele não percebe que no capitalismo não tem lugar para todo mundo. O sistema "vomita", surgem as crises, e os que mais sofrem não são os donos das empresas bilionárias que pedem concordata, mas os pais de famílias que são demitidos como se fossem um nada.
- É verdade que hoje uma boa parte da classe média pode dizer que vai ao cinema, que tem plano médico e um carro 1.0 na garagem. O que não pensamos é que isto deveria ser o mínimo, o básico de todas as pessoas. A classe média vê isso como glória. E não é. Mas como para conseguir tais benefícios a imagem de esforço e trabalho é intrínseca ao processo de aquisição de bens, encara isso como uma conquista. E, para coroar a obra, acredita que pode vencer se continuar a trabalhar para novos investimentos mercantis, mas não em qualidade.
Observação: não posso generalizar e dizer que todos que estão economicamente neste grupo são desprovidos de identidade e se preocupam mais com o consumo do que educação, por exemplo. Mas isso serve para pensarmos que, num país de tamanha dimensão como o Brasil, a maior porcentagem (repito: 52% da população) compõe um grupo repleto de contradições, que, afirmo com convicção, tem o poder nas mãos para transformar a sociedade. Afinal, soma mais da metade da população brasileira e, tendo em vista a democracia, é maioria. O problema é: ela quer mudar? O que quer mudar? Como mudar? Ela se preocupa em mudar?