Existe hoje um grande paradoxo que, ao que me parece, é inerente ao homem desses tempos líquidos. Por um lado, este homem nunca esteve, em momento algum da história, tão livre quanto atualmente. Quer dizer, nunca pensou e atingiu elevado nível de liberdade quanto acredita ter. E tanta liberdade gera espantoso individualismo, claro. Um individualismo sem limites, que surge, penso eu, de um processo histórico-social com a mudança no modo de produção. O amor, nesse estado, é simples figura quimérica, é repensado e reestruturado de acordo com o interesse de cada um. Enfim, é um investimento, e desse investimento esperamos, evidentemente, um retorno, acreditamos que existe um prazo de garantia que nos proporciona segurança.
Por outro lado, parece que as pessoas nunca precisaram tanto de outra, nunca se sentiram tão frustradas, tão sozinhas, com tantas incertezas em relação ao amor. Justamente por tratarem-no como investimento, não querem assumir riscos, não estão dispostas a conciliar projetos que, aparentemente, são incompatíveis. Por fim, afundam num mar de solidão e confusão. Sabem que esta sociedade é individualista e acreditam que é possível ser feliz sozinho, mas mesmo assim querem desesperadamente alguém, desejam o outro para envolver-se em trocas de carinhos e ouvirem elogios que elevam a estima, mesmo na mais sombria noite. Não querem se sentir solitárias. Quem quer, afinal?
Como o homem não aprende e não está muito acostumado a lidar com certas situações, às vezes cai num tremendo erro. Na angústia e desespero por encontrar um “amor de verdade”, busca, ilude-se, busca de novo, apaixona-se e aí começa o problema, porque depois de tantas tentativas mal sucedidas, pensa, mais uma vez, que encontrou a pessoa certa. Então o outro passa a ser a razão de sua existência, o amor perde o seu real estado de delírio universal e o “eu te amo” vira uma rotina, uma cobrança (porque caso um fale a frase mais dita em todo o mundo e o outro não responder à altura, qualquer um consegue prever o desastre). E como tudo começou repentinamente e o “eu te amo” chegou bem cedo na vida dos desiludidos, a saturação do amor não deve tardar a aparecer. Vai saturar mesmo, porque etapas importantes foram puladas ou interrompidas, e tudo chegou ao ponto máximo relativamente cedo. Eu não espero coisas diferentes de vários relacionamentos que possuem essas características, ou que passam a adotá-las rapidamente. E quando ocorre a saturação, não é necessário que eu explique o processo que se desenrola depois.