quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O caso da USP

Situação difícil esta que a USP enfrenta. Especialmente depois do ocorrido na madrugada de ontem.
Só para lembrarmos como começou, em maio deste ano houve um assalto na universidade que, infelizmente, gerou consequências mais drásticas. Após a morte do estudante, a USP criou um convênio com a polícia militar. No final de outubro (se não me engano), três estudantes foram detidos porque estavam portando maconha no campus. Desde então, alguns alunos, principalmente da FFLCH, ocuparam a reitoria e exigiram a saída da polícia na universidade. (Verdade seja dita também: alguns que se revoltaram com a polícia estavam muito mais preocupados em ter a liberdade de usarem suas drogas livremente.) Após a ocupação, os protestos desses estudantes aumentaram e tomou proporções maiores, com atos mais graves também.
Algumas críticas, no entanto, não caíram sobre a questão dos protestos, mas sobre quem estava protestando, isto é, a "cara" da manifestação. O estudante que trajava o moletom GAP e um óculos de sol tornou-se o símbolo da ocupação. Inclusive, até o Marcelo Tas se manifestou no seu blog (clique aqui e veja a postagem). Outra imagem-símbolo da manifestação foi a de um homem segurando um cartaz dizendo que tem tempo para ser "revolucionário" (como se esse movimento tivesse caráter revolucionário) porque é bancado pelo pai. Pior que é verdade. Quando se é bancado, sobre tempo pra tudo.


Eu gostaria de deixar registrada a minha opinião porque considero de suma importância discutir este fato dentro tanto da questão do exercício de participação quanto a questão da vigência do Estado de direito. A liberdade de pensamento, expressão e associção é garantida a todos, mas o que ocorreu na USP não foi uma forma inteligente de protesto e manifestação. Aos olhos de quem está do lado de fora, a ocupação na reitoria mostrou a contradição desses estudantes, depredando o patrimônio público, agredindo a imprensa e considerando-se presos políticos, já que para eles a presença da polícia é praticamente a retomada da ditadura.
Uma das coisas que mais me incomodou nesses estudantes foi o fato de muitos terem participado das ações usando máscaras ou camisas para cobrir o rosto. Defender os ideias mostrando a cara e assumir as consequencias como um legítimo cidadão passou longe de certos manifestantes.
Estes acontecimentos estão servindo para nos mostrar outras coisas também, que vão além dos problemas com a reitoria ou a presença da polícia no campus. Primeiro, a USP não é mais aquele modelo de instituição formadora de opinião. Educação é um problema estrutural, e a USP (bem como outras universidades conceituadas) não é uma bolha isolada que serve de exemplo para o resto. Ela também faz parte de um sistema educacional falido. O problema é que para esses "revolucinários" que têm tempo para tudo a tal da vida universitária é encarada como essa bolha. 
Além disso, como não vejo tais atos como uma forma inteligente de protetso, a imagem da luta por um ideal está corrompida, e particularmente considero até falta de respeito com aqueles que já lutaram e ainda lutam nesse país por uma sociedade e um Estado mais digno. Um estudante da USP se considerar preso político - aqueles que deram a cara para bater porque possuíam um ideal e lutaram de verdade por ele, que foram presos, torturados, perseguidos ou exilados - dentro de tais comparações chega a ser ridículo. 
Falta o entendimento de muitos que a USP não é propriedade dos estudantes e, embora todos tenham o direito de se expressar, não cabe SOMENTE a eles a decisão da permanência da polícia, mesmo porque normalmente esquecemos que esta universidade é um espaço público. Logo, é patrimônio de todos, pois é a sociedade paga para a USP existir. É como qualquer outro lugar regido pela Constituição e pelo Código Civil.
Agora, se o movimento que está ocorrendo é pela derrubada do reitor e pelo fim da repressão policial no campus, como afirmou o professor da Escola de Comunicação e Artes da USP (a ECA) Luiz Renato Martins, colocando o reitor como problema central, por que esperaram os estudantes serem detidos com maconha para iniciarem o movimento (foi depois disso que tudo começou)? Se o problema é o reitor e o conselho universitário que, segundo este professor, propõe uma espécie de militarização da universidade, isso é outra história, e mesmo assim não vai justificar a depredação do patrimônio, por exemplo. Não está clara a finalidade do movimento. Também não é a escolha de um reitor que vai fazer a diferença. O problema é estrural na USP, é preciso repensá-la e desestruturá-la. Esta sim seria uma causa justa do movimento e que todos os estudantes deveriam aderir-se a ela,  porque embora o restante dos estudantes sejam contrários às manifestações, podemos questionar qual é a porcentagem de alunos que caíram no conformismo, ideologicamente falando.
Gostaria de deixar claro que sou contra qualquer forma de violência, seja por parte da polícia, seja por parte dos estudantes. Sou contra qualquer atitude de autoritarismo e repressão, mas também sou contra atos de vandalismo. E acho válido as associações e assembléias de estudantes engajados, porque realmente esses estão dentro das discussões e não vão cair num discurso vazio ou, como dizem por aí, na rebeldia sem causa. Dentro do movimento há exceções, e são essas exceções que precisamos ouvir para debatermos os problemas mais profundamente, e não em tom panfletário.  A polícia também não pode ser a resposta. É necessário reorganizar a universidade como campo de participação e decisão coletiva.

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